quinta-feira, 29 de julho de 2021

Goleira Bárbara é vítima de ofensas e reage nas redes sociais

 

Bárbara, à esquerda e Andréa, à direita. Note como até na escolha da imagem, a foto de Bárbara é séria e suada e a de Andréa é leve e sorridente. Tendencioso é pouco.

Estou aqui pra falar sobre um estudo, uma ciência, uma arte que a comunicação exerce através de pequenos, ou melhor, sutis detalhes, pra influenciar na opinião pública. E isso tem uma origem lá nos não tão idos tempos da escravidão. Nos tempos do império portugodescendente, havia um costume que tem até hoje de atribuir a brutalidade ao negro e a sensatez pacífica ao branco.


Isso nos traz à recente discussão entre Bárbara, goleira da seleção, e Andréa Pontes, canoísta paralímpica, quando a da canoa fez piadocas sugerindo trocar a goleira do futebol pela do handebol pro Brasil ser campeão. Sem falar de seu próprio esporte, ela atiçou a atenção braba da goleira e foi aí que tudo começou. Todos noticiando que Bárbara foi quem discutiu na internet. Ok, eu sei que o nome dela é o mais forte no momento, mas o modo como estão conduzindo, é além de só pegar o hype.


Mas o que tá pegando, Saga?


Eu fico impressionado com o nível tendencioso com que alguns colegas da comunicação julgam fingindo que não julgaram. E desta vez, vou ter que meter o dedo na ferida. Por dedo, entenda minha opinião pessoal com viés sociológico numa questão que envolve uma mulher negra.

 

Veja bem, Bárbara foi ofendida de maneira agressiva por um jornal holandês, depois, foi motivo de ironia/chacota pela paratleta branca que nem é de sua modalidade, e ainda fez piada sugerindo que a troca da jogadora por outra de um outro esporte. E como bônus, foi chamada de “cheinha”. E uma reportagem do jornal O Globo tem a pachorra de dizer coisas como “apesar dos 33 anos”, claramente induzindo a opinião pública a ver a mina como problemática e imatura. Outra chamada do mesmo jornal sobre o caso diz que Bárbara foi “pivô” de uma treta e essas coisas... Na moral, ser pivô de alguma situação, implicaria que quem procurou a briga foi Bárbara. Andréa Pontes que fez isso, usando o nome de uma colega atleta pra fazer risadas questionando o talento e forma física da goleira. Reagir de forma verbal contundente, como Bárbara fez, não é ser a nega barraqueira "apesar de não ser uma garotinha" que não aceita crítica, é legítima defesa. E direito de resposta, se me permite a carona na legislação.

 

Avalie quando você é alvo de alguma piada maldosa, você poderia reagir apenas desejando paz, ou até nem falando nada. Mas num momento de expectativa por um bom desempenho, é muito natural que os nervos estejam na adrenalina. Rebater pode ser o método de autodefesa de Bárbara e precisamos respeitar isso. Não tem orientação nem “apagação” de incêndio da “sempre confiável” CBF que segure. Até porque já declararam que é uma discussão de cunho pessoal e não se meteram. Quem é o repórter pra dizer que Bárbara é que é a insubordinada intransigente geniosa explosiva? O que não pode é noticiar a parada já com um subtexto de julgamento pra cima de quem respondeu a uma provocação. E quem começou a conversa? Se não pode ser imparcial, disfarça, né, mano? Eu sempre fui adepto do jornalismo opinativo pra não cair nessa falsidade.

 

Sempre é isso: Existe uma branca e uma preta discutindo. A branca sequer é mencionada, mesmo sendo quem atirou a primeira pedra e a preta é insinuada no texto como a barraqueira. O jornalismo precisa perder ainda muitos vícios pra poder inserir suas notas de opinião dentro de notícias, aparentemente, imparciais. Lembra do jovem que foi acusado de roubo de uma bike e tanto os acusadores/caluniadores racistas quanto o ladrão branco foram deixados de lado pra se investigar o proprietário preto? Pois é. É isso. Quando as pessoas forçam uma barra injusta com alguém, provocam um dano psicológico imenso no injustiçado. Talvez seja essa a intenção mesmo. Aí, quando o injustiçado se revolta, tomam medidas de punição, alegando que a pessoa é instável emocionalmente. Coisa que, aliás, foi falada na tal reportagem, alegando que a moça tem um histórico de não aceitar orientações da federação.

 

É aquele papo: Quando o negro não aceita os grilhões, ele que é o rebelde, e não o fazendeiro que faz todo o papel do algoz. Se eu sou amigo da Bárbara, óbvio que eu ia ser a turma do ‘deixa-disso’, pra preservar sua concentração na competição. Mas, na boa, totalmente entendo – e sei bem como é – ser questionado por quem não interessa em coisas que me são preciosas. Lá vai o Brasil sacrificar uma goleira, que joga com mais 10 em campo. Barbosa feelings. E olha que o Brasil tá na briga, hein. Nem é o caso de culpá-la por ter feito algum lance duvidoso... Mesmo caso de Barbosa, em 1950. Ninguém tá crucificando os que tomaram de 7 da Alemanha em 2014. É muito complicado tentar trabalhar em um espaço de visibilidade e ainda ter que lidar com biscoiteiro de internet. Aliás, biscoiteiro não, o nome disso é troll, né? Ainda mais vindo de gente que vive na mesma condição. Quando errar também – que ninguém tá isento disso – vai apelar pro quê? Que foi praga de quem você ofendeu antes? Que foi a torcida contra? Olha... Só rezando, viu?

 

Não dá é pra meterem esse papo de que “protagonizou discussão na internet com atleta paralímpica”. Fica parecendo que ela pegou uma inocente moça com necessidades especiais e surrou a coitadinha em público. Deficiente também debocha e também precisa receber a resposta proporcional ao agravo. É constitucional. E só pra deixar bem estabelecido aqui: Não foi a Bárbara quem discutiu, bateu boca ou tretou na internet. Ela reagiu ao que não gostou e está totalmente no direito. Se poderia ter agido diferente, aí, é coisa dela, já que só quem sente sabe o que vive. Quem sai lá do mundo da lua pra falar gracinha é que deve se responsabilizar pelas besteiras que fala... e que ouve, por consequência.


Jogar o peso da responsabilidade de uma briga na preta que reagiu legitimamente pra defender a própria honra ainda é objeto de uma verdadeira engenharia a que estamos sujeitos nessa sociedade. e se denunciamos, reagimos ou tornamos público, chamam de mimimi. Mas é aquele negócio, quem fala assim não está alienado do seu preconceito, só está incomodado com o fato de ser confrontado. Não duram um minuto sem chiar quando são criticados. Querem falar, mas não foram educados pra ouvir. Quando ouvem, falam que a gente anda nervoso demais. Que peguem fogo de dentro pra fora.

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