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quarta-feira, 1 de julho de 2020

Até que a Sorte nos Separe 3: O Amor Salvou o Brasil


Seguindo a linha "vou falar de filmes aleatórios", me deparei com um belo exemplar daquilo que chamo de "ideia show, execução bleh". Até que a Sorte Nos Separe 3 - A Falência Final é um grande exemplo disso. Porque, veja, de 2000 pra cá, dois anos após o lançamento do oscarizável, e tocante,  Central do Brasil, tivemos Cidade de Deus e Tropa de Elite (I e II), entre outros. Alguns destes foram fenômenos históricos de popularidade e outros bem esquecíveis. MAs este aqui chama à atenção por ser muito mal aproveitado.

Tino e família voltam neste longa já calejados pelas perdas financeiras que tiveram na vida. Tino está cada vez mais Homer Simpson (que emburrece a cada episódio pra gerar mais piadas pastelão). Se ainda fosse emburrecer pra ser uma sátira ao cidadão comum, com as ironias, acertos e erros a que está suscetível em nossa sociedade, seria um ganho. Coisa que, aliás, o próprio Homer era no começo, tendo virado pretexto apelão de entretenimento fácil bem depois de ter feito o nome de sua família ganhar o estrelato na (antes contra-)cultura pop.

Bem, depois de ter virado simplesmente um cara gordo que fala feito garoto mimado e fazendo piadas de peido, sexo, careca e outras intelectualices, Tino consegue ser atropelado enquanto vendia biscoito na beira da estrada. A 'sorte' dessa vez, é que o autor (culposo) do atropelamento é o filho do cara mais rico do país. Uma óbvia referência a Thor Batista, que atropelou e matou um ciclista há alguns anos (saindo de boas do processo) e seu pai, Eike Batista. A mãe do jovem é uma socialite ex-modelo, numa nítida referência à Luma de Oliveira.

E o filme ensaiava um rumo meio desengonçado desse plot, até ali, interessante. Mas o filme deixa de parecer esquentando pra encontrar seu auge pra se tornar o tal desperdício de ideias que falei lá no começo. Os diretores Roberto Santucci e Marcelo Antunez pareceram ter escolhido o caminho fácil para o país onde até alguns anos atrás, ainda usava como piada mulheres seminuas e piadocas sobre escatologias, palavrões e pastelões. Nada contra, só acho que isso deveria estar a serviço de alguma informação. De preferência, cumprindo o papel do humor, que é a quebra das expectativas.

Por exemplo, aqui não tem uma história bem estruturada, mas poderia. Um cara acostumado ao fracasso consegue se reerguer com apoio do sogro milionário da filha mais velha e acaba falindo ele e o país. Plot interessante, pra quem já viu os dois primeiros filmes da franquia. Mas, na última hora, descobrimos que as trapalhadas de Faustino apenas desmascararam uma trapalhada maior e muito mais séria do tal sogro da filha, Rique Barelli. É exatamente isso que acontece, mas a coisa é conduzida de uma forma tão pasteluda que só consigo pensar que é um episódio mais alongado d'Os Caras de Pau (co-estrelado por Leandro Hassum também).

É complicado mesmo fazer humor pensando em inteligência e referências, já que o povo brasileiro é condicionado há séculos, a se alimentar do que é mais fácil e mais mastigado. Culpa de um sistema educacional que não nos leva a questionar, ou mesmo refletir. Senso comum impera e quem gosta de um filme pra pensar minimamente, fica sem. Vai assistir séries, onde o público é mais seleto. Cinema brasileiro é pra arrancar dinheiros de bilheteria e não se pode arriscar perder um Homer sequer de ingresso com piada que depende de questionar e interpretar. Boa alguém peidando ou fazendo careta aê.

E é assim por umas duas horas. Vemos um plot maneiro ser desperdiçado em virtude da fácil aceitação e vendas de bilhetes. Mas até nisso, há uns exageros bem bizarros. Como é que pode o mecânico Adelson aceitar voltar a seu alter-ego Jaques (o estilista) porque a cliente é a musa da Playboy Malu Carmo (esposa de Rique), os dois agirem como se não se conhecessem, e no final, acabam descobrindo que são conterrâneos de Nova Iguaçu, tendo sido até namoradinhos na adolescência? Explica essa porra, Bátema!

Outras incongruências:

- Gosto totalmente duvidoso o momento que Tino e Amauri vão até a presidenta Dilma Houssef. Piadas com as tais "pedaladas fiscais", até que vai, mas usar termos como 'mulher-sapa' pra fazer trocadilho entre o análogo 'homo-sapiens' e piadinhas sobre a sexualidade de uma mulher só porque ela não é uma dondoca ou um símbolo sexual foi de uma sexta-sérizice sem tamanho.

- Não entendi até hoje, porque Tino fica tão impressionado com o boneco que Amauri traz no carro, pra 'enganar' bandidos. Essa mesma piada foi feita no primeiro filme. Aqui, ela só foi - desnecessariamente - estendida. Qual é, já entendemos a piada com o brinquedo lembrar Chuck (O Brinquedo Assassino). Agora, precisaram fazer o boneco ganhar vida numa alucinação de Tino.

- Aliás, esse final do filme começa uma sucessão de soluções fáceis tiradas dos... umbigos dos produtores que dá dó. Olha só a sequência:
---> O país vai ser apagado do mapa econômico mundial
---> Nora, a auditora fria e calculista, revela isso pouco antes de dizer que precisa de sexo com Amauri
---> O casamento de Teté e Tom é transferido pro sítio do avô do noivo
---> Daniel Filho dá um sermão genérico culpando ricos e pobres pela crise
---> Juninho, filho do meio de Tino, revela que tem muita grana por views em seu canal de games no Youtube e dá de presente pra irmã poder casar
---> Teté e Tom discutem porque ambos esconderam segredos um do outro e Teté foge
---> Tino bêbado vai atrás de Teté que fugiu pro aeroporto
---> Tino convence Teté de que ficar com quem se ama durante uma crise é o melhor a se fazer  ---> Nora, que estava perto deles, decide que o Brasil não merece ser apagado da economia

Na moral, o filme começa com uma analogia às trapalhadas nas decisões imprudentes de Eike Batista e termina com uma agente do FMI da vida cancelando uma penalização econômica porque presenciou o amor de uma família e decidiu que todos merecem uma segunda chance. hahahaha

Numa próxima eu falo de O Candidato Honesto 2 ou O Suburbano Sortudo pra falar de um melhor aproveitamento de uma ideia de humor político e social. Este aqui, confesso que assisto sempre que passa, mas não perco de vista que é bem ruinzinho.

Fique sempre pra assistir aos erros de gravação. Kiko Mascarenhas com crise de riso é contagiante. Queria vê-lo num episódio do UTC qualquer hora dessas. Rá!

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