Pabllo Vittar foi uma grata surpresa que 2017 me trouxe.
Primeiro, eu só ouvia o nome e achava que podia ser algum pop-funk-pagonejo
qualquer, desses que a gente nem decora, porque vai sumir mais genericamente do
que apareceu. Até que vi um clipe de Preta Gil e vi que se tratava de uma drag Queen,
ali, montadona, dançando, rebolando e cantando como se fosse normal...
Opa, Saga, peraê, caceta! Como assim ‘como se fosse
normal’??? Calma, falei pra te provocar, gafanhoto! Normal sim! ela não estava fazendo um tipo, não era um estereótipo, caricatura
e nem alívio cômico do clipe. Era uma artista performando junto a outra
artista, no melhor estilo ‘feat.’, daqueles artistas pop da gringolândia (Usher
feat. Alicia Keys, por exemplo). E isso foi o que me chocou positivamente. Eu
esperando qualquer trejeito mais amalucado e nada! Não era como se o Tirulipa
ou o Rodrigo ‘centarro’ Santana estivessem ali pra fazer uma trans como mote de
piada.
Pois bem, o que me trouxe aqui pra falar de Pabllo foi
desdobramento direto do texto que publiquei aqui, ontem mesmo, sobre a resposta
de Tico Santa Cruz a uma crítica debochada de Falcão pra cima da cantora. Eu
até já poderia ter falado nisso antes, sobre a representatividade de Pabllo,
para o público – e artistas – lgbt, no âmbito pop ‘normal’, e não só no
universo gay/trans, como um nicho isolado da sociedade. Se aparecer mais uma
nesse estilo, acho que a sociedade teria que rever seu conceito de ‘boate gay’,
pois o mundo ia ver que Pabllos são Pabllos e isso não destrói o mundo. Violência, desemprego e hipocrisia, sim, destroem o mundo. Mas, deixa eu voltar ao fio da meada.
Pabllo logo se destacou e muito dessa popularidade veio
por ser uma drag. É o peso que se carrega com a fama, sobretudo em tempos de
internet a jato, onde toda novidade ganha atenção de forma massiva extrema. O
tal peso que falo são as críticas. Sim, todos somos passíveis de erros, de
críticas e no mundo do ‘show business’, isso se intensifica. Pabllo não estava
imune e não estará. Mas o que pega é que ela ser quem é, e botar a cara,
incomoda muita gente que acha que respeita o gay, só porque em vez de pensar em
matar, deseja que suma da sua frente, pra um país bem longe e sem câmeras.
Pabllo atraiu críticas pelo seu modo de cantar (opinei
sobre isso no outro texto. Aqui, só vou falar sobre sua representatividade).
Muita gente caiu pra cima dela, como Falcão fez, mais recentemente, mas a
resposta de Tico Santa Cruz foi muito lúcida e elevou o assunto a um patamar
muito mais complexo, que está me fazendo analisar o impacto na cultura pop e na
própria sociedade. Daí, que eu levanto a questão, seja você a elogiar ou
criticar Pabllo: Até que ponto você entende as críticas como análises críticas
musicais e até onde o que incomoda parece ser mais o fato de ser uma ‘bicha’?
Digo porque ninguém faz alarde por Anitta alternar miados
e gemidos em vez de cantar; não se reclama dessa sertanejarada gritando como se
o microfone ainda fosse item de uso exclusivo dos Jetsons, nem do pagodez que
uiva (Thiaguinho, apontei pra você agora. Rá!) ou do funk que ou grita ou
cochicha. Nenhum desses itens da moda é criticado assim, com esse sorriso “William
Waack dizendo coisa de preto”. E é aí que eu desdobro meus questionamentos do
parágrafo anterior: Até que nível essas críticas rasgadas a Pabllo são apenas
pra pegar carona no ‘meme’, uma onda do momento, e até que ponto é a homofobia
escapulindo disfarçada, como gás venenoso vazando pela fresta da parede do ‘moralismo’?
Teve um lance, na série Eu a Patroa e as Crianças, que
Michael não podia castigar os filhos por uma regra de reunião de família...
Mas, em outro dia, por outro motivo, ele achou a brecha que queria pra retaliar
algo que Junior fez. Estava na cara que o pai estava sendo mesquinho, mas mesmo
sabendo que não tinha um motivo a ver com outro, ele expôs sua ‘maldade’ e
desabafou sua ‘necessidade’ de agir contra seu filho. Pabllo está passando por
isso, certamente. Eu passo isso, todo mundo que tem um traço de oprimido social
passa por isso.
Desde muito pequeno, dentro de casa ainda, sempre ouvi que
deveria ser 150%, sendo os cinquenta a mais só de saída por ser negro. É uma
cobrança cruel, pois um branco pode fazer qualquer merda, que não é julgado com
peso a mais por sua etnia. Mas se eu errar, vou ouvir ‘tinha que ser preto’ (alô,
Waack, eu de novo, passa no RH depois do bacalhau da ceia de natal. Rá!). Pabllo está com esse alvo no peito.
Muito mais que ser uma pessoa pública do momento, Pabllo é criticada por ser
gay/trans/etc. Note pelos exemplos anteriores que ninguém vem com tanta raiva
julgar e criticar o ‘canto’ dos outros (até se critica estilo, letra... mas o cantar, a ferramenta de trabalho? Isso não se faz).
A homofobia, irmã incestuosa do moralismo, grita tão alto
que só os cães e conservadores ouvem. Mas e aí? Pabllo não pode ser imperfeita
dentro de sua representatividade? Eu já respondo: Pode e deve, pois, se deus
quiser, não será a única por muito tempo. Que venham mais que tá pouco, pois
sua representatividade até para héteros (sobretudo crianças) é o que pode
quebrar a barreira do preconceito subconsciente do senso comum metido a
moralista da sociedade. Pabllo é uma pioneira dos novos tempos e ainda vai levar muita sabatina em praça pública, mas sem suor, não tem coroação.
E tem aqueles caras que acham que vão se afirmar como machinho por diminuir um gay/trans, e sentem a necessidade de negar a identidade de gênero dela (e de todas), dizendo que (Pabllo) é homem, se referem a ela como 'ele' e dizem que seu nome é de homem... Quando disserem isso, pergunta pro machão espertão se ele próprio e Pabllo se parecem, porque, na teoria do moralista, é tudo homem igualmente. Rá!
Ah, e se você é o tipo que diz 'não ter nada contra', mas morre de medo de ser associado a gays, fique tranquilo, você não é necessariamente um hipócrita homofóbico manso, é só mal informado e talvez, um pouquinho covarde. Mas ainda há tempo, defender, respeitar ou apenas reconhecer os direitos de gays não te torna gay. Te torna humano, cidadão.
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