Crônicas, divagações e contestações sobre injustiças sociais, cultura pop, atualidades e eventuais velharias cult, enfim, tudo sobre a problemática contemporânea.

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terça-feira, 6 de maio de 2014

10 anos de Bolsa-Família e o preconceito


Se em vez de cesta básica você der o valor em dinheiro, automaticamente você está incluindo aquela pessoa no mundo capitalista das opções de gastos financeiros. Se é pra manter o papo de democracia e meritocracia, esse é um caminho mais lógico do que simplesmente negar qualquer apoio do governo ao mais pobre, num país de proporções continentais com tantas riquezas. Chega a ser uma hipocrisia muquirana dizer que isso só gera vagabundos preguiçosos. Os conservadores que defendem o esforço do próprio suor para se gozar das maravilhas de ter seu próprio dinheiro deveriam pensar mais nisso. Se o pavor conservador nacional é que nos tornemos Cuba, você dar uma cesta básica está mais aproximando disso do que com um Bolsa-Família da vida. Seria como dar uma pasta de dente sem marca no lugar do valor para que se compre uma similar, baratinha, que seja.


Essa resistência a conhecer pra falar com alguma propriedade, mesmo que por alto, se chama ignorãncia. no sentido amplo, a vontade de ignorar algo que irá mudar sua visão sobre a coisa. Se você quer falar mal de alguém, como que você vai se arriscar a conhecê-lx e se arriscar a mudar de ideia? Vai que você passa a té a admirar essa pessoa... complicado, né? Mas é necessário. Músicas, filmes, artistas, muita coisa nessa vida eu mudei de ideia e passei a gostar ou desgostar, diferente da impressão inicial. E está faltando muita gente aprender sobre benefícios sociais do governo pra poder falar mal ou bem. Por exemplo, eu tenho a nítida impressão de que esses 70 ou 80% da população que despreza o pobre (muito ódio da elite excludente, mas muita decepção com a classe média subserviente remediada) esquece ou ignora que Lula só tocou diversas políticas de FHC em frente com um viés mis popularesco, mas com a mesma essência.



Políticas externas, internas, sociais e culturais são assim mesmo, dificilmente de um governo pro outro as coisas mudam tanto, normalmente só são apresentadas com o perfil de quem está lá na hora, mas os programas são os mesmos. Bolsa-Família não é um favor, não é uma mesada, porra, isso quem ganha é filho de empresário, dondoca-esposa-troféu-bibelô de milionário. Quer comparar um benefício de cento e poucos reais com sua vidinha mais ou menos? Gente que não ganha nem 50 reais num país onde seiscentos e poucos já é considerado muito abaixo do necessário. Isso, pra mim, é o mesmo tipo de atitude que se pratica com qualquer coisa. Você tem um pouco a mais e acha muito bonito ficar com peninha, mas não quer ver aquele pobre coitado ser beneficiado quando você acha que matou um leão por dia pra 'chegar lá'.

É o mesmo mecanismo da esmola. Você tá ali e alguém te pede um dinheiro. Você nega, pois, se der dinheiro, a pessoa vai gastar com drogas, com besteira, etc. Então, alguns ainda se acham mais legais por comprar diretamente a comida que o irmão pediu, outros nem isso e ainda saem falando mal "pensa que mengana, seu vagabundo?". O negócio é o mesmo, o Bolsa é o dinheiro que a pessoa vai comprar o que lhe fizer falta. Se vai comprar cachaça também, que seja, porque uma parcela da população merece viver nessa temível 'Cuba' que a elite teme desde sempre, enquanto tanta gente com dinheiro gasta com futilidades e não vai querer dividir ou restringir suas opções de gastos?



É o famoso desprezo pelas coisas de pobre. Fica uma enorme parcela da população querendo se mostrar superior ao pobre, enquanto baba pelo que não tem, numa televisão de cachorro chamada elite. Essa é a classe média, remediada por não passar necessidade, mas indecisa, por ser um conceito muito amplo, comportando gente com muita grana e outros com um poder de fogo menor, mas ainda assim bem acima do cara que não ganha quase nada. Dá pra entender porque custa tanto deixarmos preconceitos de lado? Todo mundo quer um mundo melhor, mas ninguém quer melhorar, não como um todo, apenas a si próprio. E não sei de onde vem essa ideia de que todos saímos do mesmo ponto de partida sócio-cultural pra acharmos que todos têm as mesmas chances de vencer na vida. Pergunte-se, você é tudo o que sonhou pra si? Ou está apenas satisfeito de ter chegado bem? Porque se cortarmos um programa social como se fosse desnecessário, teríamos que fazer todo um redimensionamento de ideias pra saber porque não é todo mundo que chega lá. Tudo isso é culpa da preguiça mesmo?

Em suma, é preciso muito cuidado para que seu partidarismo não corrompa a visão do todo. Todo governo, infelizmente, vai gerar seus benefícios, mas também seus monstros, pois, as siglas dos partidos não servem de nada e os políticos vão mudando conforme interesses e conveniências, como integrantes de times de futebol ou escolas de samba. Mas precisamos observar o impacto social da coisa e ter a noção de que o Bolsa não é uma esmola, é um paliativo, outras coisas precisam ser feitas para o efetivo desenvolvimento social, o Bolsa apenas ajuda a segurar uma barra, mas não é solução. Só que a população precisa pesquisar antes de repassar piadinha que só serve pra desprezar o pobre.

Fonte: Estadão.

sábado, 16 de março de 2013

Funk: A voz dos excluídos


Aposto que você, ao ler o título, já torceu a cara e pensou "bleh, funk não é cultura, é p*utaria", mas se você ultrapassou a barreira do preconceito e chegou até essas mal traçads linhas digitais, muito que bem, façamos deste momento um tempo gostoso pra se divagar sobre a cultura e os conceitos envolvidos.

Música Lek Lek
Esse é o hit instantâneo do momento e você tem todo direito de chiar com essa música
grudenta no cérebro, mas admita, isso não é indecente, é só mais um sucesso da última
semana. 
Funk é sim a voz dos excluídos, como o Samba (maiúsculo, de raiz, de fé e de fato), como cantigas de ciranda e canções de ninar. Mas se essa voz é desafinada, feia e até indecente - em muitos MUITOS casos, seria por quê? Pense na problemática da criminalidade, aquele bandido que se faz em zonas esquecidas pelo Estado, em como ele se vê no dilema entre ser discriminado pela sociedade por ser favelado e ser uma autoridade notória dentro da sua comunidade. O que você escolheria, se você não visse chances na vida pra ser uma pessoa de bem, com um emprego respeitável e o sustento garantido para sua família?

Muito fácil dizer que isso não é desculpa, se não, todo favelado seria bandido e não haveria corrupção entre gente rica, o que nos faz remeter ao caráter. Sim, não é desculpa. Também não justifico essa possível inveja dos que têm oportunidades na vida, já que se você não sabe de onde vem seu problem, não é roubando de pobre e trabalhador ou oprimindo sua vizinhança que você vai conquistar respeito. Com certeza medo, mas assim que você cair, vai haver uma festa animada em comemoração ao seu desfecho.

Carolina Macedo, Solange em Fina Estampa, "chegou lá" para admiração
de sua mãe, que do seu mundo, viu com admiração o sucesso da filha, que
cantava sobre ser 10 indo até o chão, mas um fracasso na escola.
A questão aqui é um pouco mais profunda, é sobre o cara que cresce onde não existe educação regular e se houver, você vai passando pra nõ gerar números negativos para o governo, mas a educação mesmo não é ensinada, no sentido acadêmico. Você chega ao ensino médio e mal sabe ler, vai para a escola e lá você não tem desafio, estímulo, só a automatização de um serviço pra inglês ver. O que fazer? Faz igul à menna da novela Fina Estampa, que criou uma letra (?!) falando que preferia rebolar o rabo do que estudar porque não ia se dar bem mesmo na escola.

Então, ao se referir ao funk, procure refletir sobre isso, eles não falam nada de agregador culturalmente pra você que não vive aquela realidade, mas na localidade deles, eles são reis, chegaram lá - como exclama a mãe da referida personagem quando se depara com sua filha recém-fugida de casa na noite pra cantar funk num baile próximo. A glamourização por parte do pobre é natural, é quando você tem um destaque e um reconhecimento. O problema é quando a mídia olha pra isso e usa pra vender, enaltecendo essa cultura 'nem' como se fosse o maior barato. Não é.

Se preocupar com os rumos que os outros que apenas sonham, mas não chegam ao sucesso ninguém quer, apenas fazer das periguetes e dos 'sou f*oda' mais um produto a ser vendido para aqueles que os têm como estrelas e astros. Não, não sou funkeiro, mas admito que algumas dessas músicas me divertem, enquanto estou bebendo na festinha. Isso faz de mim um descerebrado? Não, porque depois eu volto ao meu normal e sigo a vida. Mas tem gente que não é bem assim, só vê aquele jeito, virando meme na internet e ganhando como pode.

Se não tá nem matando, nem roubando, amigo, eduque seus filhos pra que não achem que aquilo é mais que uma ilusão de respeito e mais uma fonte de trabalho e renda. Não espere que o funk eduque ou deseduque seu filho, mostre o que tem de cultural no mundo pra ele, que ele vai ouvir funk como o que realmente ele é: Entretenimento e diversão. as letras indecentes? Isso tem no forró, no pagode, no sertanejo, no rock... Não vamos fazer má publicidade da coisa agora se não fizemos antes, né? Ou façamos de tudo, mas aí, vão te chamar de politicamente correto, o que é assunto pra outra hora.
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