Crônicas, divagações e contestações sobre injustiças sociais, cultura pop, atualidades e eventuais velharias cult, enfim, tudo sobre a problemática contemporânea.

quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Requiem para meu amigo canino

Meu querido Ralph, mais de 16 anos de amizade. Eu ainda era adolescente e hoje já passei dos 30 e ele sempre esteve ali pra me receber com festa quando eu chegava em casa e seu companheirismo em guardar a porta do meu quarto enquanto aguentou subir escadas. Passou por tanta coisa e superou que a gente até esqueceu que a vida tem dessas coisas. Chegadas e partidas. Perda dolorosa, mas a vida é assim, um dia a gente se vê.

American Dad, assim como Os Simpsons e Family Guy, NÃO é um 'desenho animado', mas sim uma 'série animada'. Mas qual é a diferença? Bem, um desenho tem aventura, ação, humor, tudo num clima bem leve, perto dos temas abordados nas séries que acabei de mencionar. Política, sexo, drogas, violência e relações interpessoais de modo geral permeiam essas séries, pois são, na verdade, sátiras a algum cenário da vida real (família "tradicional" estadunidense, geralmente).

Então, entrando (UIA!) direto no assunto, estou aqui pra falar do episódio 14 da 8ª temporada de American Dad. Steve cisma que quer ter um cãozinho de estimação e Stan reluta em deixar porque lembra que na infância, ele tinha um cachorro que amava, mas foi sacrificado e isso causava receio nele em se apegar novamente a outro bicho. Bem, ele acaba permitindo, mas se mantém distante, até que o novo bichinho se aproxima e eles formam uma grande amizade... até um balão de ar quente cair sobre o pequeno cão Kisses.


O veterinário recomenda a eutanásia, já que o animal não seria mais o mesmo e viveria em sofrimento. A família aceita com tristeza, mas Stan o leva escondido a uma veterinária que promete salvar seu pet. Ela até que salva, mas o cachorro vira um remendo só. Aparelhos, peças esportivas e sei lá mais o que formam agora o cachorro que nem enxerga mais, nem age como um cão. A partir daí, a família insiste para que Stan deixe-o ir em paz, pois aquele não é mais seu cachorro, apenas um corpo que sofre sem descanso.

Dado um momento, Stan 'explode' o pequeno arremedo de Kisses, para que finalmente aceite a partida do cachorro. O interessante é que nesse momento, a animação vai para o 'céu' dos cachorros, e Kisses se vê novamente do jeito que era antes do acidente e, para sua surpresa, no lugar do carona na lancha do antigo cachorro de Stan. Eles conversam (sim, como os animais da Disney) e Kisses descobre que ali ele poderá paquerar, passear e fazer o que quiser. No final do episódio, surge a foto de um cachorro com uma dedicatória 'in memorian' e fica nítido que esse episódio foi idealizado por alguém que passou por esse drama de deixar a vida seguir seu fluxo.

Bem, quem me conhece, sabe que passei por isso bem recentemente. Meu melhor amigo se foi depois de um tempo lutando contra um sofrimento grande. Ralph sempre foi muito forte e resistente e agitado. Mudar para um Ralph um pouco mais calmo, mas não menos enérgico, foi natural, ele tinha idade (16 anos e meio), mas ultimamente ele vinha sofrendo, gemendo de dor e definhando. Estava pele e osso e já dava sinais de que era só uma questão de tempo até que tivéssemos que nos despedir. Na hora que cheguei em casa e ele não estava, recebi a noticia. 

A montagem tá meio defasada, afinal é de 2012.

Imediatamente após o choque, lembrei desse episódio de American Dad e, enquanto perambulava na internet, achei o poema Os Bichos Também Vão Pro Céu, de Carla Elísio e achei pra lá de oportuno. Segue:

escada para o céu com dois cachorros subindo

O céu é um lindo paraíso;
Que recebe a todos com amor!
Independente do ser;
Da raça e da cor!

Recebe qualquer bicho;
Após a sua partida!
Pois com ou sem asas;
Também são seres com vida!

Muitas vezes são amigos;
Fazendo-nos companhia!
Mesmo sendo irracionais;
Deus protege os animais!

Todos sem distinção;
Cada um com o seu papel!
Merecem a nossa atenção;
Pois os bichos também vão para o céu!


Poema publicado em: www.gostodeler.com.br

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Hipocrisia, inveja e recalque: Novos conceitos?


Já repararam como algumas palavras são usadas para muitas situações diferentes? O vocabulário limitado tem uma conseqüência esquisita: A lógica simplista. Coisas, por exemplo, como a palavra discriminação. Fora de contexto, qualquer idiota se vê contrariado e acusa discriminação. Não importa o caráter excludente e os grupos a que estão sujeitos. A pessoa pode ter tudo de bom de material em sua vida, mas se não tiver um negócio a mais: DISCRIMINAÇÃO! Lembre do Quico (aquele mesmo, da Dona Florinda), que fica injuriado por sua mãe permiti-lo comer ”apenas” 18 dos 20 biscoitos habituais. Percebe a lógica simplista? Pois bem, essa tendência, em tempos de redes sociais, meios de comunicação, internet e informação über-rápidas, essa prática corre mais rápido que gírias da moda. Vamos a algumas dessas palavras banalizadas e de significados simplificados (algo deturpados também), na verdade, as principais e mais usadas pela galerinha que mais posta na net.


Hipocrisia: Hipócrita é a pessoa que caga regras para os outros que ela mesma não segue. O moralismo caminha agarrado, por exemplo, quando você diz que é preciso amar ao próximo, mas pragueja qualquer um que te contrarie. Mas, hoje, hipocrisia se tornou apenas discordar de alguém que se acha dona da razão. A pessoa falou, não importa que merda de senso comum e você discordou. HIPOCRISIA! Recebi uma resposta recentemente quando defendi que Pitty está certa ao falar que a mulher é quem decide sobre si e o julgamento do homem não pode interferir. Li algo como ‘não sejamos hipócritas, a mulher tem que se dar ao respeito sim’. Caras, eu não sou hipócrita, eu realmente acredito que a mulher é dona de si e o machismo que se rasgue. Vou concordar com esse senso comum ultrapassado pra ser aceito por quem eu nem respeito a opinião? Minha jiromba que eu vou! Então, cai o mito, hipocrisia não é discordar da mente rasa, também não é aceitar se rebaixar aos senso comum pequeno pro hipócrita se sentir identificado. Próximo.

A carência é tanta, que se sentir invejada é um elogio para muitos.

Inveja: Invejar costumava ser aquele incômodo que muita gente sente por achar que deveria ter algo que outrem tem. Seu vizinho comprou aquele carro maneiro e você não, você se incomoda com isso como se ele tivesse feito pra te provocar, pra te humilhar, mostrar que você é menos que ele... INVEJOSX! Só que, olha a surpresa, basta você estar no lado oposto a alguém e já se torna invejoso. Se fulano quer julgar os outros e você critica essa tendência moralista, você já ganha a alcunha de invejoso. Se duas pessoas discutem e se xingam, é natural imaginar que as duas vão se xingar velada ou abertamente de invejosas. Pessoas que te criticam, todas invejosas... não importa se você esqueceu a auto-crítica no porta-malas do carro novo do seu vizinho.


Opinião: Essa é das boas. Opinião é um conceito que você forma diante de uma situação, experiência, enfim... uma reação sua. E isso é direito seu. Mas o fato de você ter direito à opinião não desobriga o restante do mundo de ter a sua própria, nem obriga a todos concordarem contigo. É comum ver pessoas falarem, depois de uma opinião contestada, “mas é minha opinião”, como se fosse uma carteirada do tipo ‘agora você não pode questionar’. Ela é sua, mas pode ser uma bosta mesmo assim. Não se engane se usando como referência do que há de mais legal no mundo. E uma diferenciação, enquanto é tempo, direito à opinião é universal, mas sua opinião, a peça pronta, essa não é livre de contestação só porque você quer. Aprenda a contra-argumentar, pois é aí que você mostra seu conhecimento e certeza do assunto. Só falar e ficar agredindo é sinal de que você decorou algo e não soube desenvolver.


Recalque: Recalque era pra ser, popularmente, algo relacionado a uma reserva quanto a algo. No melhor estilo ‘gato escaldado’. Mas, a banalização – sempre ela – transformou isso num xingamento quase que exclusivo da mulherada. Uma variante da ‘invejosa’. Chegou a dona se achando diva (outro termo utilizado sem limites ultimamente) e você não deu a mínima, ou comentou que aquilo era desnecessário? RECALCADA! Você não pode não achar uma pessoa o máximo só por ela precisar disso em sua auto-estima, você precisa enaltecer as pessoas só porque elas querem ser estrelas de redes sociais. Caso não, seu recalque te impediu de ver a luz. Aceita que dói menos. Rá!


Fato: Fato é fato. Dah! Um acontecimento consumado. Essa até que já tá meio que fora de moda, mas vale a menção. Contra fatos não há argumentos, ou seja, fato é um registro da realidade, é a própria verdade concretizada. Pegou um ônibus e ele quebrou? FATO! Pegou o copo com pressa e ele caiu? Fato? Sacou? Mas, há algum tempo, muita gente perdia a noção e emitia bizarrices como: “Amanhã é sexta e eu vou me divertir #fato”. Mas hein?!? A brincadeira é só amanhã e já é fato? Fato futuro? Minority Report? Gente, vamos combinar, fato só pode ser passado, né? Do contrário ainda não é fato ou nem vai ser. E quando tinham as variações #fatão, #fataço e essas coisas? Prefiria beber água.


As pessoas estão tão rasas e imediatistas que não aceitam procurar saber um pouco mais sobre um assunto. Reproduzem as palavras, muitas vezes, nem esbarrando em seus significados originais. É o que eu falei no Facebook outro dia. Não existe, na minha opinião, moralismo, nem falso moralismo, existe carência afetiva e identificação dessa gente com seus pares por meio do que lhes é comum: O julgamento daqueles que não os paparicam.
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