Por ter uma situação financeira razoável, achava que a coisa (racismo) não era tão ruim, mas ao iniciar meu projeto de monografia (que originou meu blog www.raizdosambaemfoco.wordpress.com) para a faculdade particular que eu cursava, vi que o resgate das cotas é cultural e histórico e não um assistencialismo barato. Não é um paliativo ou uma muleta social
É tudo o que o governo/império deveria ter feito se a "abolição" fosse mesmo um ato humanista da bondosa coroa imperial e não uma convenção político-econômica, seguida de um golpe de estado, um ano depois - que chamamos solenemente de Proclamação da República.
Simplesmente abriram as senzalas depois de não aguentarem as revoltas que eclodiam cada vez mais frequentemente pela liberdade e fingiram assinar um papel na boa, de proatividade. Só esqueceram de integrar o negro à sociedade. O negro deixou de ser escravizado, mas não foi feito cidadão. E, em muitos pontos, ainda não é.
Preferiu-se trocar a escravidão por mão-de-obra assalariada imigrante, mas o negro foi empurrado para as margens da cidade, como um lixo a ser ignorado até que desaparecesse. Daí, nossa cultura de achar que somos todos mestiços, ignorando que mais da metade da população é negra, resultado da própria escravidão que trouxe tanta gente da África pra cá.
Aí, nos livros, o negro virou tudo de ruim, cabelo, nariz, cor, religião, música, folclore, mitologia, etc. Assim, a sociedade é (des)educada de forma massiva, assim, os mártires negros são ignorados e os poucos reconhecidos pelo grande público - Zumbi, por exemplo, se tornam maus, feios, chatos e bobos. Lembro-me que aprendi na escola sobre diversos nomes famosos daquele período, mas muitos eram negros ou mulatos e isso não era frisado.
Ainda há a crença de que por sermos todos humano, não há racismo, que racismo é paranoia e egocentrismo de negro recalcado. Mas tudo bem, tem quem negue o holocausto durante a II Guerra, e tem quem discuta se existe mesmo miséria. É o tipo de pensamento medieval e reacionário de quem acha que deve manter tudo do jeito que está, como se o universo tivesse mesmo essa propriedade de desigualdades sociais. Como se quem reage contra esse sistema fascista de genocídio de pobre - ou pobricídio, como acabei de inventar - fosse rebelde sem causa e não um militante por um mundo melhor. É o tipo de pessoa que defende que na época da ditadura tudo era melhor, pois os gritos de gol pela seleção placebo social abafavam os gritos de dor dos torturados e os choros das famílias destruídas.
Só estamos do jeito que estamos justamente por que a maioria acha que não precisa reagir. Aí, quer ir pra rua numa modinha micareteira sem nem saber do que reclamar, aliás, sabem sim, sabem reclamar que uma 'festa que tinha tudo pra ser bonita é estragada por meia dúzia de vândalos'. Algo está muito errado.
Ps.: Reparou na naturalidade da moça da foto? Notou que ela não é um ser de outro mundo e sim, um ser humanos que viveu pra servir outros condicionada a isso por ser negra? Vi essa e muitas outras fotos numa exposição no CCBB e me emocionei... Pessoas torturadas e escravizadas e, depois, abandonadas pelas ruas e favelas sem chances de ser cidadãs. As cotas são muito válidas sim, não são pra tirar a vaga do classe média, mas pra resgatar o que não foi oferecido por direito a seres humanos de um determinado grupo social.
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