Dioclécio Luz
Em fevereiro de 2010, o jornalista Dioclécio Luz fez uma
análise um tanto radical sobre a Turma da Mônica, de Maurício de Sousa. Na
época, lembro que fiquei um tanto chocado e vi exageros típicos de quem tenta
criminalizar a violência pastelão de Chaves ou Pica-Pau. Fiquei com um pé
atrás, pois de exageros assim, nascem aberrações como A Sedução do Inocente, o
livro de 1954 que associava quadrinhos à delinquência juvenil (e principal
força propulsora da associação Batman e Robin como um casal homossexual e
pedófilo (essa segunda parte pelo lado do Bátema). É a mesma coisa que dizer
que jogos de vídeo game violentos formam psicopatas e não o contrário (psicopatas
se identificam com coisas violentas), então, na época o achei um belo de um paranóico.
O negócio é que as coisas mudam. Eu não via o todo, não era militante de causas
sociais e deixei de observar o que Dioclécio viu, em vez disso, preferi aderir
ao deboche do blog que me inspirou o titulo desse texto. Mas Dioclécio tem mais
razão do que percebi há 4 anos, a meu ver. E meu argumento pra justificar minha
opinião de hoje em dia é justamente o início de seu texto: “Existe
uma certa condescendência por parte da imprensa – e mais ainda da crítica – em
relação à Turma da Mônica. Muito provavelmente por razões nacionalistas (...)”. Eu acrescentaria aí as razões comerciais e a programação desde a infância. Quem tem coragem de contestar um ícone infantil? Eu!
Porra, Maurício!
O Porra, Maurício foi uma iniciativa das mais criativas e
oportunas. Simplesmente pegaram o texto do Dioclécio como uma visão deturpada e
deturpadora da obra de Maurício de Souza e entenderam-no como um observador que
tira as coisas de contexto para validar seus argumentos. Agora, gente, na boa,
Dioclécio poderia deixar tudo no lugar (como eu acho que deixou) e não ia dar
pra sair de algumas questões que eu já, já falo. E o Porra, Maurício vai,
ironicamente, me ajudar a justificar o Dioclécio e questionar Maurício de Souza
quanto à verdadeira representatividade do povo brasileiro em sua obra tão
longeva.
Jeremias, Pelezinho, Ronaldinho Gaúcho, Neymar e
Cleidison
Bem, esse subtítulo destacou todos TODOS os personagens
negros de Maurício de Souza, com exceção de Cleidison, que, graças a Deus, é real. NENHUM mais. E o
Cleidison nisso tudo? Porque, por esses dias, um menino da quinta série, o Cleidison,
de uma escola em Nova Iguaçu (Baixada Fluminense), pintou com lápis de cor marrom a capa de uma prova, que trazia os principais personagens da Turma da
Mônica. “Pintei da minha cor, tá? Cansei desses desenhos diferentes de mim”,
disse o aluno para a professora Joice Oliveira Nunes, que já teve sua postagem
sobre o ocorrido compartilhada mais de mil e duzentas vezes no Facebook. Como disse a professora: Recado
dado.
Fala, Maurício
Aí, não antes e nem depois de aí, surge o autor da turminha da infância de tantas gerações há 50 anos: Maurício de Sousa, o próprio, ou pelo menos,através de sua assessoria se pronuncia por nota à imprensa:
Aí, não antes e nem depois de aí, surge o autor da turminha da infância de tantas gerações há 50 anos: Maurício de Sousa, o próprio, ou pelo menos,através de sua assessoria se pronuncia por nota à imprensa:
"O menino
Cleidison tem razão a partir de sua visão do mundo e do meio.
Por que os
personagens das historinhas que ele lê não têm a mesma cor de sua pele?
E corajosamente ele
os traz mais para perto de si e dos seus colegas afrodescendentes simplesmente
usando lápis de cor.
Saída criativa e
carinhosa.
Ele não excluiu os
personagens. Ele os trouxe para seu meio.
Sou um dos poucos
cartunistas que criou personagens de cor desde o inicio de minha carreira. O
Jeremias, que inclusive faz parte de nosso atual show 'Mônica Mundi', junto com
Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão, foi criado nos anos 60. No show ele mostra
as raízes africanas que compõem nossa nação. Depois vieram protagonistas como
Pelezinho, Ronaldinho Gaúcho e Neymar.
Assim como temos a
Samira (árabe), Hiro e Neuzinha (japoneses) e tantos outros dos quase 400 que
criei nesse universo.
Impossível contar
histórias brasileiras sem essa mistura linda de cores e valores.
(Pra mim não há raça
branca, negra, amarela... Pra mim existe a raça humana)"
Conclusão: Tem mais dinossauro do que preto nessa foto abaixo.
Não há representatividade para negros ou qualquer outro grupo que não seja o caucasiano médio. Mas negros são mais de 50% da população. Eles não podem ser tão distraídos. |
Então, crianças, o que aprendemos? Que um menino na escola,
por ser negro e buscar representatividade, foi muito mais afirmativo do que o
maior quadrinista brasileiro. Vamos analisar a nota gostosinha de Maurício?
Sim, o menino cleidison tem razão, mas não foi a partir de
sua visão do mundo e do meio, negro no Brasil não é um nicho perifericamente
localizado, é maioria da população. Na verdade, foi o pai da Mônica que criou
seus personagens a partir de sua visão do mundo que o cercava, tanto que seus personagens
mais famosos são caricaturas de suas filhas e alguns traços de pessoas próximas
ou dele mesmo.
Sim, ele é um dos poucos cartunistas brasileiros a criar
personagens ‘de cor’ (e assim mesmo, com a expressão que estigmatiza), pois é o
único personagem negro. Os outros três são homenagens a jogadores de futebol,
sendo que dois deles, NEM NA VIDA REAL se assumem negros. Neymar come banana
quando o chamam de macaco, na campanha do pessoal do marketing e Pelé fala pra
apenas sorrirmos e sairmos de cena diante de uma agressão racista. Ou seja,
caricaturas, caricaturas. E ele mesmo já dá o tom da pouca representatividade,
pois, no país mais negro fora da África, ele tem UM personagem autoral negro e o
compara a UMA personagem árabe e DOIS japoneses, pra dizer que preza pela
diversidade cultural num universo de 400 personagens.
Pra ele isso é uma linda mistura de cores e pra ele não há
raças/etnias e sim uma única raça, a humana. Simplesmente, o pior e mais
cara-de-pau dos argumentos-clichê de quem tenta esconder o pouco caso com um assunto
tão sério quanto o racismo. Nenhum debate social ou filosófico, como diz
Dioclécio, comparando Mônica a Calvin ou Mafalda, que são reflexivos sobre a humanidade
e não tanto com seu próprio mundinho, como alguns personagens de Maurício. Com
essa nota, ele praticamente fez a Patricia e disse: '''Não sou racista, tenho
personagens negros'''. Sim, Dioclécio não estava tão errado. Não é fora de
contexto que se deturpa a obra de Maurício, é olhando tanto o todo quanto com
uma lupa que a gente nota fácil como ele faz pra manter o negro em seu lugar de
exclusão social nas mídias. Claro, o fato de ter trabalhos ligados às
organizações Globo, Editora Abril e essas coisas pode ter influenciado suas decisões
editoriais, ou foram almas gêmeas que se encontraram. De qualquer forma...
Porra, Maurício, tudo errado! Já não é representativo com a
maioria da população e ainda tenta explicar a diversidade de seu trabalho
comprovando que não diversificou porra nenhuma? Porra, Maurício!
Recado dado.
Um comentário:
Boa matéria! Já tinha visto o caso mas não sabia que o Mauricio tinha se pronunciado.
Eu me pergunto o porquê de tão poucos personagens negros na turma da Monica. Sem contar que o único personagem que ele criou de fato, é um personagem que mal aparece.
Não vou negar que o meio pode ter influenciado sim. Querendo ou não, ele parece ter crescido entre muitas pessoas brancas e mais o fato da maioria das pessoas que ele via nas mídias eram pessoas brancas.
Eu mesma como "aspira" a quadrinista e escritora cometi esse erro de pouca representatividade, com o tempo percebi que até os meus 16 anos eu tinha criado muuitos personagens brancos e quase nenhum negro. Mas hoje aos 19 eu problematizo isso e acho monótono não criar personagens com várias tonalidades de pele.
Mas claro, ele forçou muito a barra dizendo que ele dá um enorme representatividade colocando um negro. Ele poderia assumir que foi desleixo ou seja lá qual a real causa.
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