Num futuro fascista (não, não é hoje, ainda!) a sociedade é
programada a se comportar do mesmo modo monótono e produtivo que deixa a camada
dominante da sociedade tranqüila e despreocupada. Esse é o cenário de
Equilibrium (2002), filme que traz o ‘Bátema’, Christian Bale, como John
Preston, um policial do sistema que se rebela e vai tirar satisfações com o líder
(uma espécie de Hitler), que é inacessível e só aparece fazendo longos
discursos de obrigações sociais por telões nas ruas. A verdade é que o líder já
morreu há tempos e um membro do governo mantém as aparências pra que a
sociedade não mude.
Assim é a nossa sociedade, não é? Qualquer manifestação que
fuja ao que a elite determinou como certo é rechaçada e criticada com
eufemismos ofensivos como ‘coisa de pobre’, ‘favelado’, entre outros. O Funk
está nesse grupo. Já reparou que se falar em Funk, as pessoas já torcem a cara
e não enxergam nada de bom? Pois é, ignoram que se as pessoas falam errado ou
citam realidades de violência e alienação sexual é porque ali o Estado não
chegou, ou seja, a conclusão óbvia é que a exclusão daquela camada da população
por parte do governo gera esse tipo de manifestação. Você não veria nem uma
Anitta da vida cantando Funk (e depois renegando até o Mc do nome artístico) se
não fosse a grana que isso dá. Até porque a menina má parece ser aquele tipo de
pobre que odeia pobreza e despreza o passado no apagar das câmeras.
Mas o papo aqui não é Anitta, é Valesca, essa sim, uma autêntica
funkeira e assunto na internet recentemente, mas não só pelo Beijinho no Ombro,
ou melhor, também por isso. É que Popozuda foi citada numa questão de prova
como ‘grande pensadora contemporânea’. Antes, eu friso, pra mim, pareceu mais
um deboche do que uma homenagem daquele professor de filosofia da rede pública
no Distrito Federal (barbas de molho MODO ON), mas a questão toda é a repercussão
nas redes sociais. Aliás, esse é o grande mérito do professor, conseguiu levantar o debate (sendo deboche ou não) e não entrou em didatismos. Apenas jogou o assunto na berlinda.
Todo mundo se escandalizando com a diva funk na prova e eu injuriado que escreveram seu nome com W e não V. |
Como era de se esperar, todo mundo adora criticar o Funk
associando-o à evasão escolar, gravidez na adolescência, violência e causa da
IV Grande Guerra (aquela que virá em 2056 e que unirá a antiga União Soviética
a Marte). E, além do preconceito social inerente, pessoas acham impensável que
um artista do Funk seja considerado pra uma questão de prova – e que não é como
exemplo negativo a NÃO ser seguido. Pois bem, Valesca pode não ser a mais poética
das cantoras e a questão nem pareceu ter um propósito, estando mais para modelo
‘receita de miojo no ENEM’ do que uma bola levantada para reflexões
existenciais, mas o que é gritante é a necessidade de se esculachar o Funk, a ‘coisa
de pobre’.
Por exemplo, Gilberto Gil e Caetano Veloso, dois dos maiores
nomes de nossa música, já admitiram que ouvem Funk, que gostam de elementos ali
presentes. Tom Zé, já fez até análise de estrutura métrica de um funk e também
são contemporâneos de muita gente da ‘boa música’, argumento dos intelectualóides
que separam gosto musical por classe social de origem. Provavelmente apoiados
por aqueles que ouvem todas as mazelas gramáticas, mentais e sociais em outros
idiomas e acham que porque não entendem o que estão cantando e ouvindo, estão isentos de críticas.
Isso nos faz voltar ao início do texto, quando esperamos
John Preston (Bale) aparecer pra destronar esse líder morto que deixou um
legado de comportamento mental que não nos pertence, apenas foi imposto de
maneira sutil pelos meios de comunicação em massa, como se fosse nossa vontade,
mas é a deles. Identificação com um gênero musical ou outro é uma coisa, agora,
cagar regra para o que é certo ou errado na música, só vale se você for
corrigir um cara que promete tango e toca valsa, ok? Certo e errado na construção
de gosto não cabe, pois é como dizem: Gosto é como umbigo, cada um tem o seu.
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