Em 1990, como já citei por aqui, eu era um infantonerd
juvenil que só se aproximava de acompanhar jogos por uns minutos, pois, a
empolgação de criança me jogava logo na rua ou no quintal pra bater uma bolinha
e fantasiar que eu era um daqueles jogadores tão festejados, pelo menos, até o
pontapé inicial, quando eles poderiam ser heróis ou ser xingados como escória
da humanidade. Até hoje lembro de estar na rua quando uma vizinha me gritou do
outro lado da rua, eu jogando bola com os coleguinhas da área, e ela dizia
‘Fernando, tira essa camisa do Brasil, deu Argentina!’. Eu corri pra dentro da
casa de Vovó Garcia e assisti ao replay de Maradona passando a bola açucarada
pra Caniggia tirar Taffarel da jogada e concluir o 1x0 que nos tiraria da Copa
nas oitavas de final.
Em 1994 foi diferente, eu já vinha acompanhando jogos desde
as eliminatórias de classificação, já colecionava figurinhas e cards por conta
própria e até a lei do Impedimento eu já sacava. Assisti emocionado a uma
seleção brasileira ser salva no último minuto com dois gols de Romário contra o
Uruguai e aquela iniciativa que entrou para a cultura mundial, de ver jogadores
adentrarem o gramado de mãos dadas, demonstrando o sentimento de união e
vontade de vencer. Fomos campeões e eu lembro de cada lance, comentários de
narração, personagens (inclusive a brutalidade do assassinato do colombiano
Andrés Escobar, que eu escrevi aqui, por causa de um gol contra). Enfim, foi um
deleite pra um moleque pré-adolescente e a memória afetiva ficou pra sempre.
Em 1998, mesmo com o tropeço na Olimpíada de 1996 (Atlanta),
saindo pelas mãos (ou seriam pés) de uma Nigéria animada até na prorrogação com
‘morte súbita’, a equipe tinha tudo pra se renovar positivamente, afinal, o
discípulo de poeta Ronaldo estava em início inspirado de carreira e os
veteranos Bebeto, Dunga, Leonardo e Taffarel. A confiança de trazer o título de
4 anos antes era grande e fomos até o final jogando bem. Aí, disputamos a final
contra uma França que tinha um ótimo elenco, mas que vinha tendo muito mais
trabalho em suas disputas. Pra encurtar o drama, entrou convulsão de Ronaldo,
time apático por levar gols em falhas bobas – pra um elenco estelar e bem
patrocinado como tínhamos. Pô, pra ter noção, pintava meu cabelo de verde a cada
jogo, solávamos bombinhas, fogos e tudo que tinha direito. Depois do gostinho
do ufanismo e a decepção que isso traz, deixei de me referir a um time de
futebol como ‘nós’.
De 2002 pra cá, resumo pra você, assisti jogos, vibrei com
uns, me entediei com outros, nem o título me fez voltar à adolescência e o que
veio em paralelo foi minha própria vida adulta. Descobri os prazeres da boemia,
da musicalidade que eu já tinha e futebol foi ficando numa situação estranha.
Passou a ser só um esporte, algo comum pra mim. Eu paro pra assistir quando
tenho companhia, pra comentar os lances, mas não me empolgo e não me decepciono.
Se possível, vira só uma desculpa pra beber umas com a turma. Tudo por causa da
Copa de 1998. Confesso, fui um dos que acreditou em teorias conspiratórias de
jogo combinado e tals... até que ouvi algo que me perturbou. Um professor falou
em sala, no dia seguinte, na escola: “armação nenhuma, brasileiro não aceita
perder no futebol”. Discordei mentalmente naquela hora, mas me fez observar uma
coisa besta e que me pouparia do sofrimento. Eu aprendi a olhar para o outro
lado de um campo e ver que ali também eram jogadores e torcedores e não
figurantes em nossas festas.
2002, Brasil bateu a Alemanha na final e ninguém chorou por jogo armado. |
2006, a Seleção tinha um elenco bem mais forte que esse, mas insistia em medalhões ultrapassados também. |
Em 2010, novamente, um elenco bem mais experiente e forte, mas com um salto alto proporcional ao estrelato deles. |
Fiz esse relato nostálgico pra exemplificar como essa
derrota brasileira foi pra mim, tanto na – então – disputa do penta como foi
nessa disputa do hexa: Um jogo de futebol em que um dos times tem que fazer
mais gols que o outro. Quem perde sai. Independente de posicionamento político
e ideológico – vou te poupar das analogias entre entretenimento e manobra
midiática política por hoje – o que aconteceu foi um time de respeito, com anos
de preparação e forte senso de conjunto, jogar pra ganhar de um outro time que
teve um ano e meio de estruturação pra elenco e instrução tática. Brasileiro
não aprende a perder e começa a achar que a Seleção é que entregou o jogo, que
se tivesse rolado umas substituições a coisa seria revertida e todo roteiro
típico do processo de perda. Não é assim, como em 1998, eu vi gente falando que
aceitaria perder se fossem honrados 3x1, 1x0 e essas coisas. Mas, caras, em
’98, foi 3x0 e a revolta foi a mesma. Dessa vez com menos um: Eu. Rá!
Repercussão mundial da lavada histórica que a Alemanha aplicou no Brasil. |
Aprendi que treino é treino, jogo é jogo e merda acontece
pra todos os lados. Meus respeitos ao time alemão, que em 2006, fez festa com
um terceiro lugar estampando ‘danke’ em camisetas pra agradecer sua torcida,
que vibrou com eles, em casa e não atirou tomates e cenouras por causa de uma
derrota. ‘Ain, Saga, mas SETE gols?!’, é gafanhoto, muita coisa acontece dentro
de um campo e levar gols e uma das principais. Este texto foi uma reflexão que
tive, pois, hoje eu vejo as mesmas reações inconformadas que tive aos 16 anos.
Brasileiro tem que aprender que é só um esporte e ganhar ou perder não estão no
controle de só um lado. Num país em que as pessoas enchem a boca pra dizer ‘só
importa o primeiro lugar, vice e último são tudo a mesma bosta’, dá nisso.
Decepção infantil e estado emocional alterado. Em 1950, o Brasil nem tinha
título mundial e já estava nesse oba-oba de ‘a gente pode tudo’. Perderam,
colocaram a culpa no goleiro (se fosse hoje, xingariam Barbosa pelas redes
sociais) e ignoraram que o outro time fica com os brios aflorados por isso.
Acho que é daí que vem a máxima ‘contra o Brasil todo mundo quer crescer’, mas
isso é papo pra outra divagação.
Você repara como o Brasil não tem mentalidade pra reverter
resultados quando tanto em campo – quando jogadores se apagam e outros correm
sem objetividade – quanto torcedores entram naquele discurso infantil ‘na
próxima vai ser a gente’. Não, gente, o Brasil não precisa de promessas no
calor do momento, nem de ser comparado a uma família ou levar a sério essa
história de ‘vamos que vamos na superação’. Precisa é de estruturação, tempo de
convivência e entrosamento entre atletas e formação tática condizente com
condição física. Mais treino e menos comercial de cueca, mais futebol e menos
celebridade. Não adianta prometer hexacampeonato pra daqui 4 anos, se vai
manter-se a mentalidade de fazer um aglomeradão de jogadores famosos e contar
com o ufanismo (você acredita que nossa sociedade muda tão rápido de
mentalidade?). O mundo aprendeu a jogar compacto e com objetividade, enquanto o
Brasil ainda se baseia em firulas individuais e camisas do avesso, além de
outras superstições ‘pé-de-pato-mangalô-três-vezes’. Esporte é fundamento. E
troca. Troca, pois, pessoas de diversas nacionalidades trabalham em vários
países que não suas terras natais, o Brasil, quando negocia esse tipo de
intercâmbio cultural esportivo, é um ou outro já conhecido. Parece que já temos
a receita do sucesso e não precisamos aprender mais nada. Sabe de nada,
inocente.
Por enquanto, fica a dica: Quer aprender a tratar o futebol
como esporte? Finja que é basquete ou tênis, quando você vibra por causa da
bandeira que o jogador usa, mas não acha o fim do mundo quando perde. Porque,
bem, se seu argumento é que os jogadores ganham muito pra perder assim, todos
eles, de qualquer país, também. Um dia, o esporte no Brasil vai ser levado a sério pra não depender tanto de estatísticas passadas pra gerar confiança. Nada mais de 'chutou a bola hoje igual em 2002, quando foi campeão'.
Insisto, não sou eu. |
Nenhum comentário:
Postar um comentário